Com_traste

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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Marca..dor de tempo


Coloca-se na porta o aviso de “ocupado”
Deixando no leito a marca do corpo que não dormiu
No livro que nunca se lê, dobra-se o canto da pagina
Uma qualquer…
No porta luvas, o mapa das viagens em sonhos
Com círculos vermelhos nas cidades escolhidas para…um dia.
Na estrada ainda molhada, os pneus deixam para trás os centímetros feitos em alta velocidade
E na máquina fotográfica as imagens sucedem-se em click automáticos.
Guarda-se os pincéis do artista, a tela ainda intacta e deitam-se pelo chão as aguarelas em tons anil e pelo tecto os tons de terra prometida.
No sótão, uma guitarra encostada como corpo de contornos nunca tocados com todos os dedos
Ouve-se ao longe as melodias ainda nunca compostas
E os discos de vinil servem de pratos rasos para a ultima ceia
Uma base para copos junta-se à colecção de selos
Das cartas que nunca se escreveram, dos copos que nunca se beberam…
Num baralho de cartas viciadas
A marca no Ás de copas é invisível aos olhos do craque
Perde sempre no jogo para poder ganhar no amor
O corpo ainda dorido da ultima queda livre
Na radiografia ostentando os ossos deformados
Serve de prova para a identificação do futuro cadáver.
Sinais do tempo na pele enrugada disfarçam os sinais de nascença, impossível a identificação com ele próprio.
O carácter nem sempre definido, dá lugar à falta de lucidez e a descontos na factura do supermercado da esquina.
A mulheres que foram da vida, da sua…
Ainda bailam no corredor do tempo que perdeu.
E no salão forrado com papel de jornal antigo
Serve-se o chá das cinco com adoçante pouco natural
Nas bolachas sem sal, chora em silêncio a dentada estaladiça
E no sofá de couro velho, senta-se uma alma marcada…
Tocam à porta, e como sempre é o carteiro sem noticias
No bom dia, dito em tom de viola baixo
As cabeças erguidas olham o chão para disfarçar o silencio que vem escrito na carta que passa de mão em mão.
A marca da dor em cada marcador deixado por ai
Fará abrir o livro no lugar incerto
A porta na hora de saída
A carta sem papel nem cheiro
A caixa das jóias prometidas…
E no testamento inventado, deixará aos seus deserdados
A marca de água da vida…invisível aos olhos nus.
E no lacre de beijos queimados
Sela pactos de sangue lambendo os dedos picados
Na única rosa branca que nascera sem espinhos.
Com marcadores criado em palavras que nunca escreveu
Qual banda desenhada, sem balões de fala nem de pensamento,
Foi assim criado o super homem dos sentidos
Um dia ainda inventará Deus e um tempo em grãos de areia escorrido

1 comentário:

  1. Um «super homem» que será um homem comum...que também sente não apenas os «sentidos» mas a dor de não mais sentir.
    fica bem

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