Com_traste

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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

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A escrita com que te falo em voz baixinha
É manuscrita com letra de escola primária
Daquela em que a muito custo desenhamos,
Colocamos a língua de fora como meninos marotos
Fazemos força nos dedos, agarrando um lápis de carvão em brasa
E rasgamos o papel de linhas rectas, tão direitas que nos causa lágrimas quando as fixamos
E assim tornam-se vales e montes
Onde a custo tentamos desenhar as letras
Bem torneadas, com todas as linhas, e traços, ondas e ondinhas
Que imaginamos ser pássaros ou flores
A subir as montanhas e descer os vales
A escrita com que te falo em voz baixinha
É sussurro, insegurança, medo
É que é tão difícil o Vê não ser um condor em altos voos
E o Mê um rio ondulado com águas límpidas
Que receio que todos notem que as minhas letras
Da escrita com que te falo em voz baixinha
Não sejam as letras com que se escreve nas folhas de linhas rectas
E que não são bonitas como tanto querem que sejam
Mas eu esforço-me muito
Treino vezes sem conto
E por vezes deito-me sobre a mesa onde dorme a folha quase branca
Não fossem as linhas rectas serem montanhas e vales, e eu adormecia
Assim tento subir mesmo deitada pelas encostas
Agarrando com todas as forças o lápis de carvão
Por vezes aparecem grilos que me cantam baixinho ao ouvido
E ai eu consigo desenhar os Ós de admiração
É devagar que chego ao fim da linha
Olho-a com espanto
Contenho a euforia
Mas encho o peito de orgulho
E faço do i uma andorinha.
Consegui tanto!
Na escrita com que te falo em voz baixinha
Está agora uma seara loira dançando ao vento
Papoilas bailarinas encarnadas
E muitos pássaros de cores impossíveis
Dobro a folha quase branca cuidadosamente
Em partes rigorosamente iguais às minhas
Tantas! Bem dobradinhas
E em cada dobra um sorriso
E a escrita com que te falo em voz baixinha
É agora um avião
Podia ser um barco
Ou uma ventoinha
Mas escrevi com asas longas
Em voz baixinha
Esperando que voo em linha recta até chegar a ti

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