Com_traste

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quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Era uma vez..


O livro jaz vazio, como se não soubesse da obrigatoriedade de se morrer cheio…mesmo que de nadas fosse.
Algures a morte anunciada no jornal local, fazia saber aos mais distraídos, da possibilidade de mortes impossíveis.
Uns falaram de suicídio do escritor, ainda novo, não aguentara a pressão dos críticos e antes que dele falassem, matara-se.
Outros, desmentiam o facto, dizendo ter sido suicídio social…há muito que era do conhecimento geral a impossibilidade de se viver à margem, como clandestino, ousando ser diferente, inventando histórias, criando factos, vivendo assumidamente…vivendo.
Outros ainda afirmavam saber de uma investigação policial, assegurando existirem testemunhas do crime…o escritor fora morto pela sua própria imaginação, um personagem cometera o crime por não aceitar ser ele a vitima.
O governo fez sair um comunicado de imprensa, informava do acto de Eutanásia… afirmavam existir a vontade expressa da vitima, escrita num guardanapo de papel (onde se viam marcas de lábios ainda, supostamente femininos), e que o autor de tal vontade seria julgado logo que fosse possível saber o seu paradeiro.
E o livro continuava ali..morto e vazio, não se sabe se mais vazio ou mais morto…numa espera de algo único e especial.
Se alguém tivesse duvidas da sua existência, enquanto possibilidade de ser, poderia verificar a dureza da capa, a suavidade e brancuras das páginas..o peso, mesmo que vazio..o peso que ainda assim possuía…
Algo assim, só poderia ser algo real…
E por vezes morre-se antes de se ser todas as possibilidades…
E como pesa essa possibilidade do ser!
Mas há sempre quem leia o livro branco e consiga decifrar nas linhas vazias, a silhueta da história. Rindo, chorando, admirando-se, ficando ansioso e passando as páginas ao ritmo da sua criatividade e imaginação.
Por vezes lê a ausência de uma “assentada, não importando a posição em que o faz. Outras há em que deixa o marcador naquela página, dias e dias, apenas voltando a ela quando o tempo para nada fazer lhe permite esse luxo.
Estes livros são histórias intermináveis, não importando seguir a ordem das páginas, podendo começar pelo fim…mas acabam sempre quando já não mais nos apetece ler….ou matamos o personagem principal, capturando o criminoso que condenamos à prisão perpetua (nunca a pena de morte é usada, embora seja legal neste estado…de alma) ou a história é de amor, e o fim é daqueles em que a ultima página terá marcas de agua salgada…e ondas de corpos naquele leito.

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